domingo, 9 de maio de 2010

Situação dos Conselhos Tutelares no DF

Estudo mostra que maioria dos conselhos tutelares está deteriorada

Juliana Boechat

Luísa Medeiros

Publicação: 02/05/2010 08:02 Atualização: 06/05/2010 12:05

Os direitos das crianças e dos adolescentes do Distrito Federal estão ameaçados com a precariedade da infraestrutura dos conselhos tutelares. Apesar de o governo local ter triplicado a quantidade de conselhos nas cidades — de 10 para 33 unidades, em 2009 — na prática, ainda não houve medidas palpáveis para melhorar e garantir o funcionamento adequado da porta de entrada do sistema de proteção a milhares de meninos e meninas. Um diagnóstico dos conselhos, ao qual o Correio teve acesso, mostra que falta espaço físico, mobiliário, materiais básicos de trabalho — desde uma linha telefônica a um carro para poder levar o menor a um abrigo ou tirá-lo de uma situação de risco — na maioria das novas unidades.

O diagnóstico elaborado em fevereiro deste ano, numa parceria entre representantes do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), do GDF e dos conselhos tutelares, mapeou a situação dos 33 conselhos. Aspectos administrativos, como a quantidade de servidores, de móveis, de automóveis, de materiais de expediente, foram detalhadamente pontuados. “O jeito que o Estado trata os conselhos mostra como ele quer tratar as crianças e os adolescentes”, analisou a promotora Fabiana de Assis Pinheiro, da 3 ª Promotoria de Defesa Cível da Infância e Juventude.

Linhas telefônicas e aparelho de fax são “objetos de luxo” para os conselhos de Sobradinho II, Cruzeiro, Samambaia Norte, Estrutural e Vicente Pires. O conselho de Santa Maria Sul tem três aparelhos, mas segundo o diagnóstico, todos estão com defeito. Já no Lago Norte a solução encontrada foi pedir o telefone emprestado. A prática de “pedir emprestado” se tornou comum desde que os 23 novos conselhos foram criados pelo governo, em dezembro do ano passado (leia Memória). Para garantir o funcionamento das outras unidades, os equipamentos das unidades mais antigos são repartidos ou emprestados com os vizinhos.

O secretário executivo da Associação dos Conselheiros Tutelares do DF, Rafael Madeira, contou que o empréstimo de carro entre conselhos ocorre com frequência. Ele trabalha no conselho de Brasília Norte e lá não há veículo próprio do órgão. Para atender casos que necessitam de saídas às ruas eles “pedem emprestado” o carro do conselho de Brasília Sul. “Está faltando o necessário para dinamizar o trabalho. O governo criou 23 conselhos mas manteve a estrutura dos 10 antigos. A gente trabalha na raça, na boa vontade”, afirmou. Madeira disse que até pequenos materiais de expediente, como caneta e pastas plásticas, são dadas com parcimônia pela Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania, órgão responsável pela manutenção dos conselhos.

Instabilidade política
A realidade dos conselhos fez com que o governo se comprometesse a providenciar soluções para os problemas identificados. À época, o secretário de Justiça, Flávio Lemos, assinou vários compromissos, inclusive com prazos de execução. Identificar terrenos para construção da sede das entidades, oferecer cursos de capacitação para os novos servidores nomeados e comprar mobiliários em falta foram alguns dos itens acertados. Mas, com a saída do secretário, que deixou o governo após ter sido denunciado por supostamente receber propina de uma empresa que prestava serviço para a pasta, não há certeza se o pacto está de pé.

Para a promotora Fabiana Pinheiro, o compromisso feito anteriormente deve ser mantido pelo atual secretário, o defensor público Geraldo Martins Ferreira. “A instabilidade política do DF não pode afetar os compromissos acertados com representantes do governo. Só no último mês, a Secretaria de Justiça teve três chefes. Como implementar os conselhos se não tem continuidade administrativa?”, indagou a promotora, ressaltando que irá, o quanto antes, marcar um encontro com o novo secretário para discutir sobre a precariedade dos conselhos tutelares.

Vaivém judicial

O Governo do Distrito Federal (GDF) ampliou o número de conselhos tutelares no DF em cumprimento a uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) que, até hoje, não conseguiu derrubar. Em novembro de 2008, o Ministério Público entrou com uma ação civil pública na 1ª Vara da Infância e da Juventude pedindo a criação de 23 conselhos para atender todas as regiões administrativas do DF. Em abril do ano passado, o juiz Renato Rodovalho acatou o pedido do MP. O GDF entrou com um agravo de instrumento para suspender os efeitos da decisão judicial. Em novembro, o presidente do TJDFT, Nívio Gonçalves, confirmou a determinação da Vara da Infância. O Executivo local viu-se obrigado, então, a elaborar um projeto de lei criando os novos conselhos. A proposta foi aprovada na Câmara Legislativa e publicada no Diário Oficial do DF no dia 24 de dezembro. Quatro dias depois, o GDF recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a suspensão da decisão. O processo está em tramitação.

Medidas a caminho
Ciente dos problemas enfrentados pelos conselheiros de todo o DF, o subsecretário de Justiça, Ricardo Batista Sousa, garantiu que o processo licitatório dos veículos e dos materiais necessários está em fase final. Os novos conselhos tutelares funcionam há quatro meses. Mas, segundo Ricardo, os contratos foram congelados durante a crise política do GDF e, por isso, ocorreu o atraso. “A coordenação responsável por esse assunto vinha trabalhando desde o início. As mudanças recentes não vão interferir nesse processo. A criança e o adolescente são prioridades para a Secretaria de Justiça”, disse ele. A previsão orçamentária para 2010 era de R$ 1, 5 milhão para a instalação e manutenção dos conselhos, mas só R$ 500 mil foram liberados pelo governo.

Ricardo Sousa explicou que as etapas serão vencidas com o tempo. “Com o projeto de lei, imediatamente criamos os conselhos. Agora, temos que garantir a eficácia do serviço. Não é só o local de funcionamento, mas todo o aparato”, defendeu. A ideia da secretaria é criar Casas de Justiça em todas as cidades do DF, que abrigariam serviços à sociedade como o Conselho Tutelar. Dessa forma, os conselheiros deixarão de trabalhar em salas cedidas, muitas vezes, pelas administrações regionais. “A Sejus vai abrir as portas. Não temos imóveis. Mas estamos fazendo um levantamento minucioso dos lugares que poderemos ocupar nas administrações”. O subsecretário acredita que até o fim deste ano a situação dos conselhos tutelares estará melhor em relação à realidade atual.

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